CARTA ABERTA AO MINISTRO ANTÓNIO MEXIA
Lisboa, 22 de Outubro de 2004
Ex.º Senhor Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações.
Ouvi-o ontem falar na RTP-1 e li hoje a sua entrevista na Visão. V. Ex.ª fez declarações com as quais, a meu ver, o país só se pode congratular, de que são exemplo a afirmação de que não serão tomadas nos próximos anos decisões sobre o Aeroporto da Ota, e a afirmação de que o governo não porá em causa as decisões sobre as ligações ferroviárias a Espanha acordadas na última Cimeira Ibérica. O país terá, assim, tempo para, sossegadamente, se esclarecer sobre o problema do Aeroporto sem ter de estar permanentemente inquieto com o receio de ver tomadas, de um momento para outro, decisões precipitadas, irreversiveis e com gravíssimos custos, só possiveis, aliás, devido à ainda insuficiente informação do público sobre o assunto. É igualmente util sabermos que as acertadas decisões tomadas na última Cimeira Ibérica continuarão a ser o quadro estavel com que podemos contar para o planeamento da nossa futura rede ferroviária.
Mas, V. Ex.ª fez, também, uma declaração algo inquietante. A de que no final deste ano será tomada uma decisão relativa à futura travessia do Tejo pelo TGV. Ora, quanto a esta questão, os estudos em curso não só são insuficientes, como têm sido orientados para imporem, evitando qualquer debate esclarecedor, uma solução que, não tenho a mínima dúvida, uma critica aberta revelaria (revelará) ser altamente inconveniente para o país.
Na entrevista da Visão, V.Ex diz que lhe foram apresentados três alternativas e que mandou estudar uma quarta, a da utilização da ponte 25 de Abril. Ora, se V.Exª , que não é engenheiro, mandou estudar uma quarta solução, é porque teve a percepção de que nenhuma das três primeiras seria a melhor. A muito breve prazo, vão-lhe chegar informações para lhe mostrar que a solução da Ponte 25 de Abril também não serve. Assim sendo, entendo que lhe devo dirigir este apelo público com o pedido de que mande mandar estudar uma quinta solução, que a Refer e a Rave se têm sempre recusado a encarar e a seguir exporei, que, muito provavelmente, é a mais conveniente para o país, por ser a mais barata, mais facil de construir, com menos danos ambientais e de exploração mais rentavel.
Antes de apresentar esta solução, permito-me transcrever, por me parecer esclarecedor sobre estes assuntos, o texto que se segue, retirado de uma carta dirigida ao Engenheiro José Socrates, actual Secretário Geral do PS, em 23 de Setembro:
“Acho que o devo avisar de que, nos anos mais imediatos , não vai ser tomada, nem é necessário tomar, nenhuma decisão relativa à localização do Novo Aeroporto de Lisboa, mas que podem ser tomadas decisões gravissimas relativas ao traçado das futuras linhas do TGV. O estudo de traçados inteiramente disparatados está em curso, pelo menos um já foi adjudicado a uma empresa internacional, sem ter havido antes um amplo debate que, quase certamente, teria levado à exclusão do referido traçado e à consideração de outros…. Na sequência , procura-se fazer crer que o referido traçado é o mais indicado porque foi estudado por uma empresa de grande prestígio, escolhida por concurso público e que levou imenso dinheiro. Que, possivelmente, terá estudado muito bem o desaconselhado traçado que a mandaram estudar”.
O estudo referido é o estudo adjudicado pela Rave, no final de Julho ou início de Agosto, ao consórcio Viaponte/Cenor, por 4,3 milhões de euros, para estudar o trajecto do troço de Pombal a Alenquer da ligação por TGV de Lisboa ao Porto. Ora, se é certo que que a futura linha de TGV de Lisboa ao Porto passará perto de Pombal, ainda ninguém da Rave ou da Refer, ousou dizer como virá de Alenquer a Lisboa. Nem ainda está escolhida a localização da sua estação terminal em Lisboa, ou na sua proximidade. É absolutamente absurdo gastar dinheiro no estudo de um troço de uma linha de Caminho de Ferro, sem se saber como ela irá continuará, nem onde vai acabar. Mas, o que desaconselha os projectos actuais da Rave, é todos assentarem na utilização de comboios especiais que podem mudar o afastamento das rodas em estações com os chamados intercambiadores, de modo a poderem circular em troços com bitolas diferentes. Este é o sistema que as regiões espanholas nossas vizinhas recusaram para as linhas linhas fundamentais, mas que continua a ter adeptos em Portugal. Se o adoptarmos nas nossas linhas fundamentais, nomeadamente na futura linha de TGV de Lisboa ao Porto, teremos daqui a 40 anos uma rede ferroviária completamente desactualizada, e, desde logo, depois de gastar imenso dinheiro, teremos uma rede fundamental que deixará de servir para as mercadorias (porque os vagões vulgar de mercadorias não podem ser usados nos intercambiadores).
O fundamental para nós é que os vagões que venham a circular na nossa futura rede fundamental possam ir até à Polónia. Não o conseguir, é dramático para as nossas exportações e consequentemente para a nossa Economia.
Do exposto, decorre que a nossa futura rede ferroviária de ligação à Espanha deverá ter toda bitola europeia, devendo a sua construção interferir o mínimo possivel com a actual rede de bitola ibérica que, necessáriamente, continuará em grande parte em funcionamente, provavelmente durante algumas décadas.
Sendo este o propósito, a solução que me julgo mais conveniente para a travessia do Tejo e chegada do TGV a Lisboa, parece-me ser a seguinte:
Estação terminal perto de Sacavém, servida por uma extensão da linha vermelha do metro; trajecto da linha TGV paralelo à IC2, até acima de Alverca; travessia do Tejo entre Alverca e Alhandra, na direcção de Porto Alto por uma ponte ferroviária com 4 vias , inicialmente duas com bitola ibérica e duas com bitola europeia. Do Porto Alto, a linha pode seguir directamente para Badajóz. A ponte acima de Alverca pode ser usada pelos comboios para o Algarve, desde logo ou quando a ponte 25 de Abril começar a ficar saturada. A mesma ponte pode, eventualmente, ser usada para uma grande circular ferroviária a fechar com a Ponte 25 de Abril e a linha da Cintura. A futura linha TGV para o Porto, toda em bitola europeia poderá aproveitar a mesma ponte tendo um troço pela margem esquerda do Tejo até perto da Chamusca.
Estou convicto que esta solução , ou alguma sua variante muito próxima, é a que mais interessa ao país. Peço a V. Exª que a mande estudar.
Com os meus melhores cumprimentos
António Brotas
Professor Jubilado do IST
brotas@fisica.ist.utl.pt
Lisboa, 22 de Outubro de 2004
Ex.º Senhor Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações.
Ouvi-o ontem falar na RTP-1 e li hoje a sua entrevista na Visão. V. Ex.ª fez declarações com as quais, a meu ver, o país só se pode congratular, de que são exemplo a afirmação de que não serão tomadas nos próximos anos decisões sobre o Aeroporto da Ota, e a afirmação de que o governo não porá em causa as decisões sobre as ligações ferroviárias a Espanha acordadas na última Cimeira Ibérica. O país terá, assim, tempo para, sossegadamente, se esclarecer sobre o problema do Aeroporto sem ter de estar permanentemente inquieto com o receio de ver tomadas, de um momento para outro, decisões precipitadas, irreversiveis e com gravíssimos custos, só possiveis, aliás, devido à ainda insuficiente informação do público sobre o assunto. É igualmente util sabermos que as acertadas decisões tomadas na última Cimeira Ibérica continuarão a ser o quadro estavel com que podemos contar para o planeamento da nossa futura rede ferroviária.
Mas, V. Ex.ª fez, também, uma declaração algo inquietante. A de que no final deste ano será tomada uma decisão relativa à futura travessia do Tejo pelo TGV. Ora, quanto a esta questão, os estudos em curso não só são insuficientes, como têm sido orientados para imporem, evitando qualquer debate esclarecedor, uma solução que, não tenho a mínima dúvida, uma critica aberta revelaria (revelará) ser altamente inconveniente para o país.
Na entrevista da Visão, V.Ex diz que lhe foram apresentados três alternativas e que mandou estudar uma quarta, a da utilização da ponte 25 de Abril. Ora, se V.Exª , que não é engenheiro, mandou estudar uma quarta solução, é porque teve a percepção de que nenhuma das três primeiras seria a melhor. A muito breve prazo, vão-lhe chegar informações para lhe mostrar que a solução da Ponte 25 de Abril também não serve. Assim sendo, entendo que lhe devo dirigir este apelo público com o pedido de que mande mandar estudar uma quinta solução, que a Refer e a Rave se têm sempre recusado a encarar e a seguir exporei, que, muito provavelmente, é a mais conveniente para o país, por ser a mais barata, mais facil de construir, com menos danos ambientais e de exploração mais rentavel.
Antes de apresentar esta solução, permito-me transcrever, por me parecer esclarecedor sobre estes assuntos, o texto que se segue, retirado de uma carta dirigida ao Engenheiro José Socrates, actual Secretário Geral do PS, em 23 de Setembro:
“Acho que o devo avisar de que, nos anos mais imediatos , não vai ser tomada, nem é necessário tomar, nenhuma decisão relativa à localização do Novo Aeroporto de Lisboa, mas que podem ser tomadas decisões gravissimas relativas ao traçado das futuras linhas do TGV. O estudo de traçados inteiramente disparatados está em curso, pelo menos um já foi adjudicado a uma empresa internacional, sem ter havido antes um amplo debate que, quase certamente, teria levado à exclusão do referido traçado e à consideração de outros…. Na sequência , procura-se fazer crer que o referido traçado é o mais indicado porque foi estudado por uma empresa de grande prestígio, escolhida por concurso público e que levou imenso dinheiro. Que, possivelmente, terá estudado muito bem o desaconselhado traçado que a mandaram estudar”.
O estudo referido é o estudo adjudicado pela Rave, no final de Julho ou início de Agosto, ao consórcio Viaponte/Cenor, por 4,3 milhões de euros, para estudar o trajecto do troço de Pombal a Alenquer da ligação por TGV de Lisboa ao Porto. Ora, se é certo que que a futura linha de TGV de Lisboa ao Porto passará perto de Pombal, ainda ninguém da Rave ou da Refer, ousou dizer como virá de Alenquer a Lisboa. Nem ainda está escolhida a localização da sua estação terminal em Lisboa, ou na sua proximidade. É absolutamente absurdo gastar dinheiro no estudo de um troço de uma linha de Caminho de Ferro, sem se saber como ela irá continuará, nem onde vai acabar. Mas, o que desaconselha os projectos actuais da Rave, é todos assentarem na utilização de comboios especiais que podem mudar o afastamento das rodas em estações com os chamados intercambiadores, de modo a poderem circular em troços com bitolas diferentes. Este é o sistema que as regiões espanholas nossas vizinhas recusaram para as linhas linhas fundamentais, mas que continua a ter adeptos em Portugal. Se o adoptarmos nas nossas linhas fundamentais, nomeadamente na futura linha de TGV de Lisboa ao Porto, teremos daqui a 40 anos uma rede ferroviária completamente desactualizada, e, desde logo, depois de gastar imenso dinheiro, teremos uma rede fundamental que deixará de servir para as mercadorias (porque os vagões vulgar de mercadorias não podem ser usados nos intercambiadores).
O fundamental para nós é que os vagões que venham a circular na nossa futura rede fundamental possam ir até à Polónia. Não o conseguir, é dramático para as nossas exportações e consequentemente para a nossa Economia.
Do exposto, decorre que a nossa futura rede ferroviária de ligação à Espanha deverá ter toda bitola europeia, devendo a sua construção interferir o mínimo possivel com a actual rede de bitola ibérica que, necessáriamente, continuará em grande parte em funcionamente, provavelmente durante algumas décadas.
Sendo este o propósito, a solução que me julgo mais conveniente para a travessia do Tejo e chegada do TGV a Lisboa, parece-me ser a seguinte:
Estação terminal perto de Sacavém, servida por uma extensão da linha vermelha do metro; trajecto da linha TGV paralelo à IC2, até acima de Alverca; travessia do Tejo entre Alverca e Alhandra, na direcção de Porto Alto por uma ponte ferroviária com 4 vias , inicialmente duas com bitola ibérica e duas com bitola europeia. Do Porto Alto, a linha pode seguir directamente para Badajóz. A ponte acima de Alverca pode ser usada pelos comboios para o Algarve, desde logo ou quando a ponte 25 de Abril começar a ficar saturada. A mesma ponte pode, eventualmente, ser usada para uma grande circular ferroviária a fechar com a Ponte 25 de Abril e a linha da Cintura. A futura linha TGV para o Porto, toda em bitola europeia poderá aproveitar a mesma ponte tendo um troço pela margem esquerda do Tejo até perto da Chamusca.
Estou convicto que esta solução , ou alguma sua variante muito próxima, é a que mais interessa ao país. Peço a V. Exª que a mande estudar.
Com os meus melhores cumprimentos
António Brotas
Professor Jubilado do IST
brotas@fisica.ist.utl.pt
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