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agosto 16, 2006

A água do rio

Segundo Platão (Crátilo), Heráclito teria dito que uma pessoa não se poderia banhar duas vezes no mesmo rio. Querendo com isto significar um movimento geral de todas as coisas, numa mudança permanente da própria matéria. Tudo se apresentando em perpétuo devir. Raramente se utiliza a frase nesta acepção. Pelo contrário, ficou a ideia da passagem do tempo, expressa na imagem de um rio. Numa visão trivial do fluxo temporal. Não se sabe ao certo o que queria Heráclito dizer, mas podemos considerar que estamos perante uma visualização da oposição entre o material e o imaginado. Como escrevem Kirk e Raven "a imagem do rio esclarece o género de unidade que depende da conservação da medida e do equilíbrio na mudança." Assim, pode Crátilo afirmar que nem sequer uma vez nos podemos banhar no rio. Pois tal acção implica, por si só, mudança. Recorro a esta proposição para clarificar que a presença irremediável não refere o estático, mas antes um perpétuo devir. Sendo que, para o que aqui nos interessa, o rio indica, não o imaginário, mas o social. O corpo ao banhar-se no social, provoca nesse simples acto, uma transformação radical do preexistente. Em rigor, é esse o sentido da palavra irremediável.

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